Dilan Camargo: “O cérebro da criança gosta de brincar”

Autor de poemas infantis bem-humorados como Tem macaco na fila e Olimpíadas da bicharada, Dilan Camargo, 70 anos, escreveu mais de 20 títulos com predomínio da poesia, dividida entre o público adulto e infanto-juvenil, como Bamboletras (localizado na estante P na Plataforma Elefante Letrado) e O vampiro Argemiro (localizado na estante L na Plataforma Elefante Letrado), da Editora Projeto. E é com essa bagagem que o escritor é sempre visto participando de atividades com crianças que compartilham do seu mundo nas salas de aula, feiras e eventos.

Nasceu em Itaqui e é formado em Direito, com mestrado em Ciência Política. É constantemente convidado para ser patrono em feiras no interior do estado, título que ganhou na Feira do Livro de Porto Alegre em 2015, e foi o autor convidado para participar da FLIPinha como representante do Rio Grande do Sul em no mesmo ano.

Recebeu vários prêmios, como o Açorianos de Melhor Livro Infantil; Livro do Ano, nas categorias Infantil e Narrativa Curta, da Associação Gaúcha de Escritores; e Troféu Palavra Viva, do Sintrajufe. Tem dois livros infantis selecionados para o Catálogo da Feira do Livro de Bolonha, Itália. Em 2013 e 2014 foi finalista para do Prêmio Jabuti, na categoria livro Infantil.

O escritor conversou com o Elefante Letrado e contou sobre a inspiração em Cecília Meireles, sobre a importância da ludicidade no ensino e sobre a formação de novos leitores:

“As crianças e os jovens não podem ser subestimados na suas capacidades de ler e de interpretar”.

– Como é escrever poesia para o público infanto-juvenil? Qual é a diferença para quando escreve aos adultos?

Dilan Camargo: Aprendi essa diferença com a Cecília Meireles. Ela foi a minha inspiração e referência tanto para escrever para adultos como para crianças. Li, ainda na universidade, “Viagem” e “Mar absoluto”. Quando nasceu a minha primeira filha, Graziela, lia para ela “Ou Isto ou Aquilo”.  Tive reforçada essa percepção da diferença entre leitores com a noção de “leitor implícito” de Peter Hunt. Para as crianças escrevo com a alegria da palavra. Com a ludicidade da língua. Ritmos, rimas, sonoridades, surpresas, paradoxos, os sem sentidos da realidade. Para adultos, uso as mesmas figuras de poesia mas com uma temática efetivamente adulta. Sei para qual leitor escrevo e isso não me limita, pelo contrário, é um desafio constante.

– O que acha da escolha das leituras nas escolas?

Dilan Camargo: As escolas precisam de ampla liberdade para fazer as escolhas de leituras e  todas devem ser respeitadas, porque elas são comunidades de valores, laicas ou de confissões religiosas.  Quanto melhores e mais amplos os conhecimentos dos selecionadores sobre a literatura infanto-juvenil, sobre as  qualidades literárias do texto, riqueza de visão de mundo, as escolhas poderão  contribuir para formar novos leitores. As crianças e os jovens não podem ser subestimados na suas capacidades de ler e de interpretar.

– Como é sua relação com as crianças (em bate-papos, sessões de autógrafos nas escolas, feiras)

Dilan Camargo: De igual para igual. Logo eles se tornam íntimos e participativos. Gosto de “brincRIar”com eles, de reger o “coral de leitores” quando fazemos leituras em voz alta. Gosto de instigar a imaginação deles com as surpresas da poesia. A poesia exerce como nenhuma outra forma de linguagem a função restauradora e incentivadora da capacidade de formar imagens com palavras, segundo o professor e psicopedagogo francês Serge Boiamare que trabalha com jovens que “odeiam ler”.

– Como é ser um autor tão festejado, homenageado e convidado como patrono em tantas feiras?

Dilan Camargo: Sou um pequeno escritor de pequenos leitores. Tanto quando escrevo para crianças, jovens, ou adultos. Procuro falar de coração a coração. Tento seguir a frase célebre de Montaigne: “não faço nada sem alegria”. Gosto da proximidade com a gurizada, com os jovens. Os adultos são mais arredios, infelizmente. Como já andam trocando o nome de feira do livro para festa literária, acho que fazemos uma festa com as leituras.

– Como aumentar o estímulo da leitura nas salas de aula? Passa pela formação do professor? E qual o papel da família?

Dilan Camargo: A responsabilidade de formar leitores ou cidadãos, em primeiro lugar, é da família. Cabe à escola um trabalho de integrar a leitura na sua rotina diária como uma atividade indispensável no contexto pedagógico.

A leitura de palavras escritas é uma habilidade intelectual, artística e cultural indispensável para a integral formação de um ser humano. O domínio da leitura e da escrita é uma ferramenta de aprender e de saber viver.

Não há dúvida sobre o papel de mediador de leitura a ser exercido pelas professoras. Elas também precisam ser leitoras contagiantes. Para isso, precisam de apoio e de formação permanente. Defendo, de modo veemente, a leitura em voz alta em sala de aula. Na Hora do Conto, a professora ou a bibliotecária fazem a leitura de uma história para os alunos ouvintes. Na Hora da Poesia, todos podem ler juntos, e em voz alta, com a “regência” de uma mediadora.

– És muito premiado. O que acha das mudanças que o prêmio Jabuti trouxe, como unir os prêmios de literatura infantil e juvenil?

Dilan Camargo: Um equívoco absoluto. Sem nenhuma razoabilidade. Inexplicável através de critérios de qualquer natureza. Representou um empobrecimento literário do Prêmio Jabuti. Até parece sugerir alguma forma de discriminação. Não pode ser falta de conhecimento ou de critérios literários. A junção de categorias, e principalmente, a exclusão da ilustração das categorias premiadas parece uma espécie de revanchismo ou de conspiração da mediocridade. Espero que esse erro grosseiro seja corrigido na próxima edição do Jabuti.

– Na 64ª Feira do Livro, fará a palestra “ludicidade e cognição”. A que se refere?

Dilan Camargo: Em poucas palavras: o cérebro das crianças gosta de brincar. As crianças aprendem brincando, quando os adultos não organizam e nem comandam as suas brincadeiras. Isso não significa deslegitimar toda metodologia pedagógica de ensino e aprendizado. Longe disso.

O lúdico, principalmente na infância, é decisivo para o desenvolvimento da cognição intelectual e da coerência emocional, um caminho para dar sentido ao mundo.

*Título do livro da editora Projeto

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